Los Roques, o tempo estagnou no maior arquipélago do Caribe. |
Lentamente, o turbohélice inicia a sua
descida em direção ao aeroporto de Gran Roque, única ilha deste arquipélago
caribenho que oferece uma infraestrutura turística, um porto e a pista de pouso
para as aeronaves de pequeno porte, provenientes da capital venezuelana.
Hipnotizados pelo cenário que vislumbram do alto, os passageiros não desgrudam
mais os olhos da janela até a aterrissagem. Visto de cima, o contorno das praias
forma molduras de areia cintilante e a água é tão límpida que deixa transparecer
o tapete de corais. Em algumas baías, dá para discernir veleiros ancorados, e
as diferentes tonalidades de azul do mar causam um efeito visual impressionante:
as embarcações parecem estar suspensas no ar.
O aeroporto de Los Roques já é um cartão postal em si |
Assim que desembarcam no vilarejo de Gran
Roque, os turistas se dirigem à entrada do Parque Nacional através de um guichê
estrategicamente fincado na beira da pista de pouso. Ali pagam uma taxa, e só
depois recolhem a bagagem. Em seguida, levando as próprias malas, vão se
dispersando aos poucos, em busca de suas respectivas pousadas. A pé, pelas ruas
de areia, como fazem os 2500 habitantes deste minúsculo perímetro urbano onde
não existe automóvel e nem poluição. Os roquenhos dependem inteiramente do
turismo como fonte de renda, assim como dependem do continente para suprir qualquer
gênero de abastecimento – exceção feita à pesca. Aliás, uma iguaria local
renomada é a lagosta, servida em diversos estabelecimentos, seja sob a forma de
recheio numa empanada (uma espécie de pastel) ou para incrementar
um tagliatelle.
Gran Roque acolhe todos os turistas provenientes de Caracas. Ali, não existem carros e as ruas são de areia. Mas é só lá que ficam as pousadas, os restaurantes e algumas lojinhas de artesanato. |
Em Los Roques
À noite, o programa é perambular pelo
vilarejo, tomando um mojito aqui e um
petisco ali, e depois jantar em algum dos inúmeros restaurantes. Há desde
japonês a italiano, passando por pizzaria a simples biroscas. O ambiente do
vilarejo é despretensioso, o clima agradável, não existe “dress code” e todos
andam à vontade. Muita gente anda até descalços. A praça principal, a Bolivar, fica cheia de gente, e
dependendo da estação do ano, reina uma atmosfera festiva e animada em bares. Porém , quem
está atrás de vida noturna abundante ou boas compras não vai encontrar. A Posada Malibu, que é um pouco afastada do centrinho, tem uma simpática decoração na laje com um charmoso varandão desnivelado estilo lounge, enfeitado com espreguiçadeiras. Os quartos são pequenos, confortáveis, e têm banheiro privativo. Só a localização, digamos, não é tão privilegiada, mas ninguém se queixa em Los Roques - todo o cenário é tão extraordinário que o resto é o resto...
Cayo Agua, um retalho do paraíso |
Lounge na Posada Malibu: bom gosto na rusticidade e aconchego genuino |
O mesmo vale pra quem está idealizando um hotel de luxo: em Gran Roque cabe charme, bossa, criatividade, boa vontade. Los Roques é o destino ideal para uma viagem romântica, só para ficar jiboiando sob o sol do Caribe. Mas, graças à brisa constante e mar manso, é também muito atraente para quem gosta de praticar atividades esportivas como kite surfe, windsurfe, caiaque e mergulho, cujo equipamento pode ser alugado em algumas das praias mais frequentadas ou nas lojas especializadas do vilarejo.
Segundo uma carta de navegação local,
seriam necessários 16 dias para percorrer todo o rosário de ilhas, ilhotas,
bancos de areia, “motus” e cayos – a palavra exata para definir
estes ancoradouros paradisíacos e as praias desertas. Mas, como a maioria dos visitantes não
dispõe de tanto tempo, há um certo consenso sobre quais são os lugares mais exuberantes a serem
visitados. E assim, a programação turística “oficial” de Los Roques inclui
sempre as ilhas cuja localização é mais próxima de Gran Roque, como Crasqui,
Espenqui e Francisqui. Uma corrida de táxi-boat para qualquer uma destas
praias, leva cerca de meia hora. Uma curiosidade local é o nome de muitas das
350 ilhas do arquipélago, que sempre acaba com “qui”. Na verdade, é uma
adaptação da palavra inglesa “key”, que significa ilha.
Cayo Tres Palmeras |
Mas há quem queira fugir do típico roteiro
para explorar um pouco mais este arquipélago. A melhor opção é alugar um
veleiro ou um catamarã, por um ou mais dias, pernoitando a bordo se for o caso,
e usufruindo de total liberdade para ir e vir de qualquer ponto, esticando as
distancias ao bel-prazer. Outra grande vantagem deste meio de transporte é a
mordomia, pois o charter incluiu um capitão e uma hostess, que,
respectivamente, cuidam da navegação e das refeições. Detalhe: este programa
não é tão oneroso quanto aparenta ser, e é ideal para uma família ou um grupo
de amigos que queiram total privacidade.
Além de se libertar das amarras com Gran Roque, é uma fórmula para
evitar a presença de qualquer outro grupo de turistas, pois o objetivo é
ancorar em locais bem afastados e ainda mais selvagens e desertos, como Cayo de
Água.
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Localizado ao extremo oeste de Los Roques, é formado por várias faixas de
praia cuja areia chega a ser leitosa de tão fina. Só poucas embarcações chegam
até lá, porque é longe. A topografia é formada por pequenas elevações e a ilha
tem um farol isolado no topo de uma colina. Vale o passeio até lá, mas é
preciso muito cuidado com os carrapichos nos trechos onde há vegetação
rasteira, pois são invisíveis e quando espetam a sensação é dolorosa e impede qualquer
tentativa de caminhar descalços.
Velejando assim livremente, além de lugares
selvagens, também é provável encontrar personagens tão característicos como
Polito, um pescador local bem famoso que mora como a família num “rancho” (barraco
de pescador) de frente para uma praia deserta que – mais outra! - também não
consta do mapa, mas fica próximo a um santuário de pelicanos. O ar de bonachão,
o traje curioso ( ele usa um boné cheio de penas) o tornou conhecido.
O pescador Polito (foto ao lado) é um dos pescadores mais reputados de Los Roques. Na cabeça, um boné com penas sobressaindo o transforma num personagem. A lagosta do seu restaurante é famosa.
Este
roquenho, que sobrevive da pesca e com um modesto restaurante cujo pátio é
arenoso onde são servidos almoço e jantar todos os dias do ano, fala pouco.
E é claro que a clientela, pelo menos a
que fica atenta às dicas que sopram na região, vai encomendar um daqueles
pratos de lagostas grelhadas, especialidade da casa. Com um pouco de
negociação, ele cobra em dólar (ou euro) cerca de U$35 por pessoa, com direito
ainda a ostras e um tipo de marisco local chamado botuto. Mas, fato curioso, Polito se declara avesso a multidões. No
caso, isto não deveria ser seu motivo de preocupação: a palavra multidão não
consta no vocabulário de Los Roques.
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